População carcerária do país aguarda por mudanças na lei. Profissionais querem monitoramento eletrônico
A onda mais recente de violência no Rio de Janeiro trouxe à tona temas espinhosos na área da legislação criminal. Aumento de pena, restrição de benefícios a condenados e redução da maioridade estão entre os tópicos em voga na agenda nacional. Pouco se sabia, entretanto, sobre a opinião dos defensores públicos em relação a tais questões. Conhecedores profundos da realidade da população encarcerada no país, da qual pelo menos 80% são pobres com no máximo o ensino fundamental, esses profissionais que prestam assistência jurídica gratuita demonstraram, em pesquisa, posturas reveladoras. Um terço da categoria no Brasil, por exemplo, defende que a idade penal, 18 anos atualmente, seja diminuída. Quase 20% dos defensores nos estados querem a instituição da prisão perpétua no país. Cerca de 35% apoiam um aumento do limite de cumprimento de pena, hoje de 30 anos.
Para Sandra Carvalho, diretora da organização não governamental Justiça Global, alguns posicionamentos foram motivo de surpresa. "É lamentável ver os defensores públicos tendo essa percepção, porque são pessoas que, assim como os integrantes do Judiciário e do Ministério Público, têm conhecimento do que é cumprir pena no Brasil. Vejo que está cada vez mais enraizada na sociedade a filosofia equivocada de que aumentando o encarceramento haverá queda da criminalidade", afirma uma das ativistas em direitos humanos mais respeitadas dentro e fora do país. Por outro lado, Sandra afirma que ficou positivamente satisfeita com algumas opiniões dos defensores, entre elas a concordância em extinguir a prisão especial para quem tem diploma, expressa por aproximadamente 40% da categoria.
Os dados fazem parte do 3º Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil, divulgado na última semana pelo Ministério da Justiça. Para André de Castro, presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos, as opiniões da categoria estão equilibradas. Ele enxerga o dado sobre a redução da maioridade penal por outro ângulo. "Se 70% estão convencidos de que a mudança é um retrocesso, corroborando o que especialistas afirmam, acho que estamos no caminho certo", diz o representante. Ele aponta o defensor como um profissional bem avançado nos temas sociais. "Pela própria atuação, pela natureza do seu trabalho, diria que tendemos a ser progressistas nos assuntos relacionados aos direitos humanos. Agora, é claro que somos cidadãos como outros quaisquer, vivemos num mesmo contexto social que o restante da sociedade, então somos permeados pelas ideias que circulam no dia a dia", minimiza.
Pena de morte Na avaliação de Jomar Moreno, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal, qualquer tentativa de endurecer o encarceramento — como instituir pena de morte ou prisão perpétua — não apresenta efeito prático algum. "Pelo contrário, as cadeias são depósitos medievais onde seres humanos são jogados sem qualquer perspectiva de melhora, eles só saem piores. Se pena de morte resolvesse, os países que a adotam teriam reduzido substancialmente a criminalidade, o que não ocorreu", critica. O advogado destaca não ser contrário à punição. "Errou tem que pagar, porém, o Estado não pode criar um monstro como ocorre hoje nas cadeias. É para esses lugares que a gente vai mandar os adolescentes?", questiona. Ele lamenta que tais assuntos só entrem na pauta do Congresso Nacional e da sociedade depois de um caso real chocante. "As discussões acabam sendo emocionais, e não científicas, baseadas em dados."
Outra questão controversa presente na pesquisa diz respeito ao monitoramento eletrônico de presos, realidade em alguns estados do país, que têm implementado o modelo de forma experimental. "É bem polêmico porque vai na lógica do vigiar e punir, do controle sobre o sujeito que se presume ser perigoso. O que sabemos é que o monitoramento não resolverá a questão da reincidência nem da superlotação nos presídios, enquanto houver essa gana por encarcerar cada vez mais", diz Sandra. Apesar das ponderações da ativista, o nível de aceitação da medida entre os defensores é alto. Mais da metade, tanto entre os profissionais da União quanto os dos estados, defende o controle eletrônico de presos provisórios e também condenados.
Fonte: Jornal O Estado de Minas (09/11 página 7 - Nacional)
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